sábado, 31 de outubro de 2015
sexta-feira, 30 de outubro de 2015
quinta-feira, 29 de outubro de 2015
quarta-feira, 28 de outubro de 2015
terça-feira, 27 de outubro de 2015
segunda-feira, 26 de outubro de 2015
domingo, 25 de outubro de 2015
sábado, 24 de outubro de 2015
sexta-feira, 23 de outubro de 2015
quinta-feira, 22 de outubro de 2015
quarta-feira, 21 de outubro de 2015
terça-feira, 20 de outubro de 2015
segunda-feira, 19 de outubro de 2015
domingo, 18 de outubro de 2015
Kardec, o pensador
Kardec, o pensador
Não se pode medir a importância e profundidade das ideias dos pensadores pelo êxito que alcançam ao publicar as suas obras. Alguns sistemas filosóficos passam por um período mais longo ou mais curto de hibernação até que consigam despertar a atenção e o interesse dos leitores. Outros, que parecem surgir vitoriosos, fenecem com o tempo e cedem a praça a novos sistemas fascinantes à fantasia do homem na sua busca interminável da verdade.
Existirá alguma lei que determine ou que, pelo menos, explique essas variações de êxito dos sistemas filosóficos? Parece que há. Para início de conversa, creio poder afirmar-se que o êxito, em termos humanos, é uma componente quantitativa mais do que qualitativa. Em outras palavras: o sucesso é alcançado por aquele que consegue interessar o maior número de pessoas e não pelo que tem o melhor sistema, a melhor peça teatral, o melhor romance, a mais bela sinfonia. Por conseguinte, podemos também concluir que o êxito mundano de um sistema filosófico depende da sua sintonia com o pensamento dominante de cada época. Dando um passo mais à frente, parece legítimo afirmar, em consequência, que pensador de êxito é aquele que consegue interpretar e traduzir o sentimento e as tendências dominantes da sua época, ou, por outra, que se afina com o estágio evolutivo das maiorias. Isto vale dizer que cada época tem os filósofos que merece.
Não é difícil de demonstrar a tese. Pelas tendências da sociedade moderna, podemos facilmente inferir os tipos predominantes de pensadores e seus sistemas. E que vemos? Uma esmagadora maioria humana sem rumo, num esforço desesperado para libertar-se dos conceitos fundamentais da moral que, embora nem sempre bem observados, constituíram as bases de tudo de positivo e construtivo que se realizou ao longo dos séculos. Aquilo a que hoje assistimos é a busca desordenada da liberdade total, impossível em qualquer sociedade organizada. Assistimos à procura do prazer a qualquer custo. E vemos apreensivos a repetição de épocas dramáticas do passado, quando aprendemos, através da História, que a fuga desesperada na direção do gozo inconsequente é também uma fuga para longe de Deus.
O homem das megalópoles supercivilizadas é um ser sem rumo, tão frágil na sua aparente segurança, tão abandonado aos seus próprios recursos humanos, que não aguenta uma hora de solidão; quer estar cercado de ruídos, de risos – ainda que falsos –, de alegria – ainda que contrafeita –, de movimento – mesmo que arriscando a vida. Mas que é a vida para esse homem, senão apenas o prazer de viver? Existir é a ordem do dia; não importa como, nem porque, nem para que: o importante é existir pura e simplesmente, seguindo cada qual as suas inclinações e preferências, fazendo o que bem entender, com o mínimo possível de responsabilidade pessoal e social – apenas o necessário para garantir a sobrevivência do corpo. Também, se o corpo morrer, não tem grande importância, porque tudo termina mesmo com a morte… E quanto aos ruídos, os risos, a alegria e os movimentos não conseguem anestesiar suficientemente os sentidos, apela-se para o atordoamento produzido pela bebida e pelas drogas.
Dirá o leitor, algo alarmado, que esse é um retrato pessimista e exagerado da civilização moderna. Talvez seja exagerado; pessimista não, porque nem toda a humanidade está assim contaminada, graças a Deus. Dentro dela grupos humanos equilibrados lutam por dias melhores, aparentemente bradando no deserto, mas semeando a esperança do futuro, preocupados com a alucinação do presente, mas certos do funcionamento inevitável das leis divinas que atuarão no devido tempo para introduzir as correções necessárias.
Enquanto isso não ocorre, porém, é aquele o espetáculo a que assistimos. E do meio do tumulto universal da insatisfação humana, que filosofias e que pensadores vemos medrar vigorosamente e alcançar o sucesso? Jean Paul Sartre e sua companheira Simone de Beauvoir, Camus, e até Gabriel Marcel, que pregam a ausência de Deus, o absurdo da existência, a liberdade total para o homem escolher o seu próprio destino. São os papas e cardeais do existencialismo, uma corrente de pensamento que só cuida do simples fato de existir; o resto não importa, pois, segundo eles, a vida não tem mesmo explicação, nem finalidade, nem sentido.
No campo da teologia, temos os pensadores da chamada teologia radical. São eles William Hamilton e Thomas J. J. Altizer, que se dizem teólogos – e luteranos! – de uma teologia sem Deus. Para eles, Deus morreu. Para eles, não há mais, na sociedade moderna, lugar para Deus. A humanidade precisa aprender a viver sem Deus. Pregam uma das grandes contradições do século, ou seja, o ateísmo teológico. Repetem as palavras de outro luterano famoso – Dietrich Bonhoeffer, executado pelos nazistas já ao fim da Segunda Guerra, que assegurava ser perfeitamente possível viver sem Deus, sem desespero e sem complexos de culpa.
No campo social vamos encontrar Herbert Marcuse, o profeta do caos, que, com sua interpretação freudiana da História, deseja ver liberados todos os instintos porque, segundo ele, o processo civilizador tem sido uma sucessão de repressões. Por outro lado, numa contradição que nós, pobres mortais, não entendemos muito bem, receita a liberdade excessiva que transformaria a Terra num inferno. Suas doutrinas são tão nebulosas quanto sua linguagem hermética, quase iniciática.
Aliás, os pensadores do nosso tempo – filósofos, teólogos e uma boa parte dos cientistas – não escrevem mais para o grande público, gente como você e eu: ao contrário, usam uma linguagem difícil, quase impenetrável ao entendimento daqueles que não tiveram muito treinamento para isso. Praticamente escrevem apenas para seus companheiros do mesmo ofício. Procurem ler, por exemplo, “Eros e Civilização” ou “Ideologia da Sociedade Industrial”, de Marcuse, e observem bem como é pequena a quantidade de ensinamentos que se consegue filtrar daquela terminologia agreste e abstrata.
São esses, no entanto, os guias atuais da inquietação humana, os orientadores dos que ainda não encontraram seus caminhos. São os que se afinam com as tendências da época.
Não criaram propriamente um sistema; apenas converteram em palavras as angústias e a desorientação da época em que vivem. E por estarem em sintonia com a sua época, com a sua gente e com o estágio evolutivo dessa gente, alcançam o êxito mundano, passam a ser os pensadores da moda.
Enquanto isso, doutrinas amadurecidas e puras como o Espiritismo esperam a sua vez. Esperam que a humanidade as alcance, porque, pela sua maturidade, exigem certo grau mínimo de maturidade de seus adeptos. Por isso, Allan Kardec continua ignorado nas universidades, nos estudos de filosofia, nas histórias do pensamento humano. Apesar da celeuma que levantaram as ideias que ajudou a trazer para o mundo, foi também ignorado em sua época – não estava em sintonia com as maiorias de então.
Ao nascer Allan Kardec em 1804, a França acabava de emergir das crises e das agonias da Revolução Francesa. Brilhava o astro napoleônico e se ensaiava uma reconstrução da sociedade em novas bases, aproveitando o racionalismo, o cientificismo. Quase que junto com Kardec, com uma diferença a mais de seis anos, nasceu também Augusto Comte, o filósofo do Positivismo, doutrina escorada na frieza do fato observado. Fora da observação direta dos sentidos humanos, nada era digno de especulação – estava na área da metafísica. Nessa filosofia também não havia lugar para a sobrevivência do Espírito, nem para Deus. O “Curso de Filosofia Positiva” foi publicado entre 1830 e 1842 e o “Sistema de Política Positiva”, de 1851 a 1854. É praticamente a época em que Kardec começou a se interessar pelo fenômeno das mesas girantes, de tão tremendas consequências.
Em 1857, quando faleceu Comte, surgiu também “O Livro dos Espíritos”. O Positivismo era uma doutrina vitoriosa, porque respondia às tendências principais da especulação da época. O racionalismo frio dos enciclopedistas era ainda recente e deixara profundas marcas nos Espíritos. Comte trabalhara ativa e demoradamente esse terreno fértil e parecia realmente sintonizar-se com as correntes dominantes dos intelectuais contemporâneos. Suas doutrinas se espalharam pelo mundo, e aqui no Brasil, terra tão generosa para as ideias novas, viriam influenciar os homens que lançavam as bases da República. No entanto, apesar de todo o seu idealismo, do sentido humano, e da predominância da moral, faltou à doutrina de Comte o sentido superior da existência. Para ele, eram estéreis as especulações em torno do Espírito e da ideia de Deus, que nem mesmo como hipótese de trabalho entrava nas suas cogitações. Depois da partida dos Espíritos encarnados que lhe davam ressonância, o Positivismo decaiu no interesse daqueles que se ocupam da discussão de ideias.
Com Kardec está acontecendo o contrário: estão chegando os Espíritos que reconhecem nas suas ideias a marca da Verdade. Já naquela época, a despeito da tremenda oposição que encontrou, conseguiu semear largamente a sua seara. Sabia que a colheita não iria ser imediata, nem espetacular, porque apenas uma fração da humanidade estaria madura para aceitar a sua pregação, mas que importa isso para aquele que tem a certeza de estar ao abrigo da Verdade?
Uma pergunta poderá, no entanto, surgir da parte de alguém: Foi Kardec um pensador, um filósofo no sentido em que conhecemos a palavra? A resposta é: Positivamente, sim. Sua obra pode ser dividida em duas partes distintas: uma, a que escreveu, por assim dizer, a quatro mãos com os Espíritos – “O Livro dos Espíritos”; outra, a que escreveu ainda com evidente assistência espiritual, mas com seus próprios recursos e ideias que assimilara no trato dos problemas transcendentais que haviam sido colocados no primeiro.
A muito leitor desavisado poderá parecer de pequena monta o trabalho individual, pessoal, de Kardec na elaboração de “O Livro dos Espíritos”, mas não é isso que se passou. Imagine-se um de nós, o leitor ou eu, diante da tarefa. Sabemos apenas que nos incumbe escrever, com a colaboração dos Espíritos, uma obra de extraordinária importância.
É, porém, extremamente cautelosa a colaboração dos Espíritos. A princípio nem mesmo dizem que a tarefa consiste em escrever um livro para instrução do mundo nas coisas espirituais. Não dizem que feição deve ter o trabalho, a que roteiro deverá obedecer. Guiado apenas pelo seu bom senso e pela sua sadia e viva curiosidade, Kardec vai fazendo as perguntas sobre aquilo que lhe interessa conhecer. A princípio – confessaria mais tarde – desejava apenas instruir-se na exploração daquele mundo maravilhoso de conhecimentos que se abria diante dele. O assunto o fascinava, porque lhe trazia respostas a perguntas que até então haviam ficado sem solução no seu espírito. Daí por diante, tudo se aclarava: Deus existia realmente, como existia o Espírito. Este sobrevivia, preexistia e se reencarnava. Os “mortos” se comunicavam com os “vivos” e o universo todo era regido por leis morais flexíveis mas iniludíveis. Cada um tinha a responsabilidade pelos seus atos, recompensas pelas suas vitórias, responsabilidades pelas suas falhas. Os seres, como os mundos, eram organizados em escala hierárquica de valores, onde predominavam as leis simples da moral. A teologia ortodoxa estava toda ela precisando de uma total reformulação nos seus conceitos mais queridos, mais essenciais. Não havia inferno, nem glórias eternas, ao cabo de uma única existência terrena.
Tudo isso surgia das suas conversas intermináveis com os Espíritos. Só o decorrer do tempo e a acumulação das respostas é que lhe vieram mostrar que perguntas e respostas tinham uma estrutura que lhes era própria e adquiriam a feição de um livro que ele resolveu dar à publicidade, pois que se ele aprendera ali tanta coisa útil, embora totalmente revolucionária, era necessário transmitir tais conhecimentos aos seus semelhantes.
E assim surgiu, em 1857, “O Livro dos Espíritos”, obra básica, vital ao entendimento de toda a filosofia espírita. Pela primeira vez rasgavam-se os véus que ocultavam a Verdade. Pela primeira vez se escrevia uma obra reveladora de tão profundos conhecimentos, em linguagem singela, ao alcance de qualquer pessoa. Bastava saber ler ou saber ouvir o que alguém lesse.
Mas não parava ali a tarefa do grande missionário. Era preciso prosseguir, extraindo da nova doutrina as consequências que ela acarretaria sobre os demais ramos do conhecimento humano. Podemos imaginar Kardec a fazer a si mesmo algumas perguntas. Como ficaria a doutrina evangélica de Jesus, diante daquelas ideias? E a Ciência? E a religião dita cristã? Como funcionava essa estranha faculdade a que deu o nome de mediunidade? Dessas perguntas, surgiram os demais livros da sua obra.
E assim, de 1854, quando, aos 50 anos de idade, Kardec se interessou pelo fenômeno das mesas girantes, até 1869, quando regressou ao plano espiritual, decorreram os 15 anos libertadores que a humanidade ainda não aprendeu a reconhecer pelo que realmente valem e pelas influências cada vez maiores que vão exercer no futuro.
Fonte: Reformador, ano 87, n. 3, p. 19(63)-21(65), mar. 1969.
Hermínio C. de Miranda
sábado, 17 de outubro de 2015
sexta-feira, 16 de outubro de 2015
quinta-feira, 15 de outubro de 2015
quarta-feira, 14 de outubro de 2015
terça-feira, 13 de outubro de 2015
segunda-feira, 12 de outubro de 2015
domingo, 11 de outubro de 2015
sábado, 10 de outubro de 2015
sexta-feira, 9 de outubro de 2015
quinta-feira, 8 de outubro de 2015
quarta-feira, 7 de outubro de 2015
terça-feira, 6 de outubro de 2015
segunda-feira, 5 de outubro de 2015
domingo, 4 de outubro de 2015
Allan Kardec - modelo de circunspecção recolhimento
Allan
Kardec - modelo de circunspecção recolhimento
Poderíamos imaginar, nos dias de hoje, um jovem naturalmente calmo, recolhido,
circunspecto?
Essas qualidades naturais em um jovem são raras e indicam um Espírito elevado
aí encarnado. Em se tratando de
um Espírito superior encarnado, essas qualidades lhe são inerentes desde a
infância. Pois Kardec deve ter sido uma tal criança, um tal jovem.
Nós o surpreendemos, num artigo publicado na Revista Espírita, falando um pouco
sobre si mesmo. Reproduzimos aqui um parte de sua fala:
“Enquanto eu estava calmamente na
cama, um de nossos amigos me viu várias vezes em sua casa, posto que sob uma
aparência não tangível, sentando-me a seu lado e conversando com ele, como de
hábito. Uma vez ele me viu de roupão, outras vezes de paletó. Transcreveu nossa
conversa e no-la remeteu no dia seguinte. Percebe-se bem que era relativa a
nossos trabalhos prediletos. Querendo fazer uma experiência, ofereceu-me
refresco. Eis a minha resposta: ‘Não
tenho necessidade disto, porque não é o meu corpo que está aqui, vós o sabeis. Não há a menor necessidade, portanto, de
criar para vós uma ilusão.'
Uma circunstância muito estranha apresentou-se naquela ocasião. Seja por
disposição natural, ou seja resultado de nossos trabalhos intelectuais, sérios
desde a minha juventude, poderíamos dizer, desde a infância, o fundo de meu
caráter foi sempre de extrema gravidade, mesmo na idade em que não se pensa
senão no prazer. Esta preocupação constante me dá uma aparência de frieza, mesmo de
muita frieza. É isto, pelo menos, o que muitas vezes
me tem sido censurado. Mas sob esse envoltório aparentemente glacial, talvez o
Espírito sinta mais vivamente do que se tivesse uma maior expansão exterior.
Ora, em minhas visitas noturnas ao nosso amigo, ele ficou muito surpreso por me
ver completamente diferente; estava mais aberto, mais comunicativo, quase
alegre. Tudo respirava em mim a satisfação e a calma do bem-estar. Não estará aí um
efeito do Espírito desprendido da matéria?"[1]
Em suas obras Kardec chama a nossa atenção para a necessidade da seriedade, do
recolhimento da pureza de intenções como condição indispensável para a
assistência dos bons Espíritos e das boas comunicações. Vamos reproduzir,
nestas reflexões sobre o recolhimento, alguns trechos das recomendações dadas
pelo nosso Mestre, e que poderão servir ao espírita, individualmente, e aos
grupos espíritas que desejam bem se conduzir.
Disse ele: “O concurso dos bons
Espíritos, tal é, com efeito, a
condição sem a qual não se pode esperar a Verdade. Ora, depende de nós obter
esse concurso. A primeira de todas as condições para merecermos a sua simpatia é o
recolhimento e a pureza das intenções. Os Espíritos sérios vão aonde são
chamados seriamente, com fé, fervor e confiança. Eles não gostam de ser usados
em experiências, nem de dar espetáculo. Ao contrário, gostam de instruir
aqueles que os interrogam sem ideias preconcebidas. Os Espíritos levianos, que
se divertem de todos os modos, vão a toda parte e de preferência aos lugares
onde encontram ocasião para mistificar. Os maus são atraídos pelos maus
pensamentos, e por maus pensamentos devemos compreender todos aqueles que não
se conformam com os princípios da caridade evangélica. Assim, pois, quem quer
que traga a uma reunião sentimentos contrários a esses preceitos, traz consigo
Espíritos desejosos de semear a perturbação, a discórdia e os desafetos.
A comunhão de pensamentos e de sentimentos para o bem é, assim, uma condição primordial e
não é possível encontrar essa comunhão num
meio heterogêneo, onde têm acesso paixões inferiores como o orgulho, a inveja e
o ciúme, paixões que sempre se revelam pela malevolência e pela acrimônia da
linguagem, por mais espesso que seja o véu com que se procure encobri-las. Eis
o abcda Ciência Espírita. Se quisermos fechar a
porta desse recinto aos maus Espíritos, comecemos por fechar-lhes a porta de
nossos corações e evitemos tudo quanto lhes possa conferir poder sobre nós. Se
algum dia a Sociedade se tornasse joguete dos Espíritos enganadores, é que
a ela teriam sido atraídos. Por quem? Por aqueles nos quais eles encontram eco,
pois eles vão apenas aonde sabem que são escutados. É conhecido
o provérbio: Dize-me com quem
andas e dir-te-ei quem és. Podemos parodiá-lo em relação
aos nossos Espíritos simpáticos, dizendo: Dize-me o que pensas e dir-te-ei com
quem andas.
Ora, os pensamentos se traduzem
por atos. Se admitirmos que a discórdia, o orgulho, a inveja e o ciúme não
podem ser inspirados senão por maus Espíritos, aqueles que aqui trouxessem
elementos de desunião suscitariam entraves, com o que indicariam a natureza de
seus satélites ocultos. Então sópoderíamos lamentar sua presença no seio da
Sociedade. Queira Deus - e assim o espero - que isto nunca aconteça, e que,
auxiliados pelos bons Espíritos, se a estes nos tornarmos favoráveis, a
Sociedade se consolide, tanto pela consideração que tiver merecido, quanto pela
utilidade de seus trabalhos.
(…) Se tivéssemos em mira apenas
experiências para satisfação de nossa curiosidade, a natureza das comunicações
seria mais ou menos indiferente, pois nelas veríamos somente o que elas são.
Como, porém, em nossos estudos não buscamos uma diversão para nós, nem para o
público, mas o que queremos são comunicações verdadeiras, para isso
necessitamos da simpatia dos bons Espíritos, e essa simpatia só é conseguida pelos que afastam os maus
com a sinceridade de seu coração.[2]
"O perigo está no império que os maus Espíritos exercem sobre
as pessoas”
“Dizer que Espíritos levianos
jamais se introduziram em nosso meio, para encobrirmos qualquer ponto
vulnerável de nossa parte, seria muita presunção de perfeição. Os Espíritos
superiores podem até mesmo
permiti-lo, a fim de experimentar a nossa perspicácia e o nosso zelo na busca
da verdade. Entretanto, o nosso raciocínio deve pôr-nos em guarda contra as
ciladas que nos podem ser armadas e em todos os casos dá-nos os meios de
evitá-las.
O objetivo da Sociedade não é apenas
a pesquisa dos princípios da Ciência Espírita. Ela vai mais longe. Estuda
também as suas consequências morais, pois é principalmente nestas que está a sua verdadeira utilidade.
Ensinam os nossos estudos que o
mundo invisível que nos circunda reage constantemente sobre o mundo visível e
no-lo mostram como uma das forças da Natureza. Conhecer os efeitos dessa força
oculta que nos domina e nos subjuga malgrado nosso, não será ter a chave de muitos problemas, as
explicações de uma porção de fatos que passam despercebidos? Se esses efeitos
podem ser funestos, conhecer a causa do mal não é ter
um meio de preservar-se contra ele, assim como o conhecimento das propriedades
da eletricidade nos deu o meio de atenuar os desastrosos efeitos do raio? Se
então sucumbirmos, não nos poderemos queixar senão de nós mesmos, porque a ignorância
não nos servirá de desculpa. O
perigo está no império que os
maus Espíritos exercem sobre as pessoas, o que não é apenas
uma coisa funesta do ponto de vista dos erros de princípios que eles podem
propagar, como ainda do ponto de vista dos interesses da vida material.
Uma das táticas do maus Espíritos para alcançar os seus fins é semear a desunião
“Ensina a
experiência que jamais nos abandonamos impunemente ao domínio dos maus
Espíritos, porque suas intenções jamais podem ser boas. Uma de suas táticas
para alcançar os seus fins é a desunião, pois sabem muito bem que
podem facilmente dominar quem estiver sem apoio. Assim, o seu primeiro cuidado,
quando querem apoderar-se de alguém, é sempre inspirar-lhe a desconfiança e o
isolamento, a fim de que ninguém possa desmascará-los esclarecendo-o com
conselhos salutares. Uma vez senhores do terreno, podem à vontade
fascinar a pessoa com promessas sedutoras; subjugá-la por meio da lisonja às suas inclinações, para o que
aproveitam o lado fraco que descobrem a fim de melhor fazê-la sentir, depois, a
amargura das decepções; feri-la nas suas afeições; humilhá-la no seu orgulho e,
muitas vezes, elevá-la por um instante apenas para precipitá-la de mais alto.
Eis, senhores, o que nos mostram
os exemplos que a cada momento se desdobram aos nossos olhos, tanto no mundo
dos Espíritos quanto no mundo corpóreo, circunstância que podemos aproveitar
para nós próprios, ao mesmo tempo que procuramos torná-la proveitosa aos
outros.
(…) Uma sociedade espírita requer
outra condição - a assistência dos bons Espíritos - se quisermos obter
comunicações sérias, porque dos maus, caso lhes permitamos tomarem pé, nada
obteremos senão mentiras, decepções e mistificação. Este é o
preço de sua própria existência, pois os maus serão os primeiros agentes de sua
destruição. Eles a minarão pouco a pouco, caso não a derrubem logo de início.
Sem homogeneidade não haverá comunhão de pensamentos e, portanto,
não serão possíveis nem calma nem recolhimento. Ora, os bons só se apresentam onde encontram tais
condições. Como encontrá-las numa reunião onde as crenças são divergentes, onde
alguns nem mesmo creem e, por conseguinte, onde domina incessantemente o
espírito de oposição e de controvérsia? Eles sóassistem aos que desejam
ardentemente esclarecer-se para o bem, sem segundas intenções, e não para
satisfazer uma vã curiosidade.
Querer formar uma sociedade
espírita fora destas condições seria dar provas da mais absoluta ignorância dos
princípios mais elementares do Espiritismo.
(…) Aliás, nós possuímos um meio
infalível para não temer nenhuma rivalidade. É o que nos dáSão Luís: Que
haja entre vós compreensão e amor, disse-nos ele. Trabalhemos,
pois, para nos compreendermos. Lutemos com os outros, mas lutemos com caridade
e com abnegação. Que o amor ao próximo esteja inscrito em nossa bandeira e seja
a nossa divisa. Com isto desafiaremos a zombaria e a influência dos maus
Espíritos.(…)[3]
(…) "A tática ora em ação
pelos inimigos dos espíritas, mas que vai ser empregada com novo ardor, é a
de tentar dividi-los, criando sistemas divergentes e suscitando entre eles a
desconfiança e a inveja. Não vos deixeis cair na armadilha, e tende certeza de
que quem quer que procure, seja por que meio for, romper a boa harmonia, não
pode ter boas intenções. Eis por que vos advirto para que tenhais a maior
circunspeção na formação dos vossos grupos, não só para a vossa tranquilidade, mas no
próprio interesse dos vossos trabalhos.
A natureza dos trabalhos
espíritas exige calma e recolhimento. Ora, isto não é possível
se somos distraídos pelas discussões e pela expressão de sentimentos malévolos.
Se houver fraternidade, não haverá sentimentos
malévolos, mas não pode haver fraternidade com egoístas, ambiciosos e
orgulhosos. Com orgulhosos que se chocam e se ferem por tudo; com ambiciosos
que se desiludem quando não têm a supremacia; com egoístas que só pensam em si mesmos, a cizânia não
tardará a ser introduzida. Daí,
vem a dissolução. É o que queriam nossos inimigos e é o
que tentarão fazer.
Se um grupo quiser estar em
condições de ordem, de tranquilidade, de estabilidade, é preciso
que nele reine um sentimento fraterno. Todo grupo ou sociedade que se formar
sem ter por base acaridade
efetiva não
terá vitalidade, enquanto os que
se formarem segundo o verdadeiro espírito da doutrina olhar-se-ão como membros
de uma mesma família que, não podendo viver todos sob o mesmo teto, moram em
lugares diversos. Entre eles, a rivalidade seria uma insensatez, pois ela não
poderia existir onde reina a verdadeira caridade, porque a caridade não pode
ser entendida de duas maneiras. Reconhecei, pois, o verdadeiro espírita pela
prática da caridade em pensamentos, palavras e atos, e dizei a vós mesmos que
aquele que em sua alma nutre sentimentos de animosidade, de rancor, de ódio, de inveja e de ciúme mente para
si mesmo se deseja compreender e praticar o Espiritismo.
O egoísmo e o orgulho matam as
sociedades particulares, como matam os povos e as sociedades em geral. Lede a
história e vereis que os povos sucumbem sob o amplexo desses dois mortais
inimigos da felicidade humana. Quando se apoiarem nas bases da caridade, serão
indissolúveis, porque estarão em paz entre si e consigo mesmos, cada um
respeitando os bens e os direitos dos vizinhos. Essa será a nova era predita, da qual o
Espiritismo é o precursor, e para a qual todo
espírita deve trabalhar, cada um na sua esfera de atividade. É uma
tarefa que lhes incumbe, e da qual serão recompensados conforme a maneira pela
qual a tenham realizado, pois Deus saberádistinguir os que no Espiritismo só procuraram a sua satisfação pessoal
daqueles que ao mesmo tempo trabalharam pela felicidade de seus irmãos.[4]
Encerramos aqui essas breves
reflexões sobre o que Allan Kardec considera importante para o bom andamento
dos grupos sérios, e de que ele mesmo o exemplo. Aos final de cada trecho
extraído de suas orientações nós incluímos a referência ao texto integral, a
fim de que cada um que queira lê-lo na íntegra
saiba onde encontrá-lo.
Incluímos as definições de dois
termos que foram utilizados por Kardec nos textos acima, que buscamos nos
dicionários do século XIX.
Circunspecção:
Vigilância prudente que se exerce sobre suas palavras e suas ações, atento a
todas as circunstâncias. Discrição, reflexão, reserva, moderação, sabedoria.
Agir, falar com circunspecção. Atenção, discernimento, precaução, critério. Contrários:
imprudência, leviandade, temeridade.
Circunspecto: que
presta muita atenção ao que diz e faz; atento, ajuizado, discreto, prudente,
refletido, reservado, sábio. Contrários:
aventureiro, imprudente, leviano, temerário.
Recolhimento: ação de
se recolher. Buscar o recolhimento na solitude. Estado de uma pessoa que se
recolhe.
Recolher-se: reunir
em si mesmo toda sua atenção, para ocupar-se somente de uma coisa. Recolher-se
antes de falar. Reunir, recolher suas forças. Inferir, tirar alguma dedução. (Nouveau
Dictionnaire Universel,de Lachâtre)
[1] Revista
Espírita, fevereiro de 1859 - Os
agêneres
[2] Revista
Espírita, julho de 1859 - Sociedade Parisiense - Discurso de encerramento do
ano social 1858-1859.
[3] Revista
Espírita, julho de 1859 - Sociedade
Parisiense - Discurso de encerramento do ano social 1858-1859.
[4] Revista
Espírita, fevereiro de 1862 - Cumprimentos
de ano-novo.
Nona Oficina de Estudo Minucioso do Evangelho
Em 03 de Outubro encerramos o estudo do capítulo VIII – Bem-aventurados
os que têm puro o coração.
Estudamos nesta tarde, Instruções dos Espíritos:
Deixai que venham a mim a as criancinhas, itens 18 e 19,
Bem aventurados os que têm olhos fechados, itens 20 e nota 21.
O que Jesus quis dizer com criancinhas? De que infância Ele falava?
Essas questões e muitas outras foram ampliadas.
As oficinas têm como objetivo nos colocar em contato
com Jesus e suas lições, é sempre um momento muito especial!
Em 7 de Novembro teremos novas reflexões.
Estudar o Evangelho nos oferece as ferramentas necessárias para
caminhar em direção a Jesus.
E você, tem aprendido e praticado o que o Mestre ensinou?
sábado, 3 de outubro de 2015
sexta-feira, 2 de outubro de 2015
Jan Huss: 600 anos de desencarnação
Jan Huss: 600 anos de desencarnação
Enrique Eliseo Baldovino
henriquedefoz@uol.com.br
henriquedefoz@uol.com.br
No dia
6 de julho de 1415 foi queimado vivo, em Constança (Germânia, futura Alemanha),
o mártir Jan Huss, célebre pensador, sacerdote e reformador tcheco, nascido no
ano de 1369,1 em Husinec ou Hussinecz, reino da Boêmia (hoje República Tcheca),
reino que, à época, formava parte do Sacro Império Romano-Germânico.
O
precursor da Reforma nasceu sob o reinado do imperador Carlos IV e sob o
pontifi cado de Gregório XI, alguns anos antes do grande cisma do Ocidente, que
se pode encarar como uma das sementes do hussitismo. Segundo o costume da Idade
Média, Jan Huss, foi assim chamado porque nasceu em Hussinecz, pequeno burgo
situado ao sul da Boêmia, no distrito de Prachen, nas fronteiras da Baviera.
Filho
de pais camponeses, Jan Huss completou o seu curso na Universidade de Praga,
onde se formou em Teologia (1394), em Artes (1396) e em Filosofi a (1396),
fazendo-se bastante conceituado nos meios universitários. Como escritor, deu também
sua grande contruibuição na fi xação da ortografi a e na reforma da língua
literária tcheca.
Alguns
livros de sua autoria, que sobreviveram até os nossos dias, nos idiomas latim,
francês, tcheco e inglês são, entre outros: Questio de indulgentiis (1412),
Explication de la foi (1412), De ecclesia (1413), Explication des saints
évangiles (1413), Ortografie Česká (1857), The letters of John Hus (1904) etc.
Seguidor
do reformador John Wycliffe Huss foi ordenado sacerdote em 1400 e, no ano
seguinte, ocupou o cargo de reitor da Universidade de Praga, quando se
aproximou da obra do reformador inglês John Wycliffe (c.1328-1384), passando a
considerar-se teologicamente seu discípulo, juntamente com Jerônimo de Praga
(1379-1416), seguidor de Huss. Em 1401, tornou-se pregador da capela de Belém,
em Praga (capital do reino da Boêmia), e tinha o apoio do arcebispo. Jan Huss
foi confessor da rainha Sofia (1376-1425), esposa do rei Venceslau.
Huss,
como Wycliffe, não aceitava a supremacia papal, mas apenas a pessoa do Cristo –
e não Pedro – como chefe e cabeça da Igreja, considerando o Evangelho “única
lei”. Seu pensamento sobre a Igreja era influenciado fortemente por Agostinho e
tinha, a respeito do clero e sua relação com a propriedade, pontos de vista
semelhantes aos dos valdenses. (Sobre os valdenses, leia-se A caminho da luz, o
item As advertências de Jesus, cap. 18, livro ditado pelo Espírito Emmanuel ao
médium Chico Xavier, Editora FEB.)
As
críticas de Jan Huss ao clero foram aos poucos evidenciando sua simpatia para
com a doutrina de Wycliffe (que traduziu a Bíblia para o seu idioma nacional, a
fim de pô-la ao alcance do povo), e a oposição cresceu contra Huss, sendo ele
excomungado em 1410. O resultado disso foi um grande tumulto popular em Praga,
quando Huss, com o apoio do rei Venceslau (1361-1419) e do povo, foi festejado
como patriota e herói nacional, por ser contrário ao tráfico das indulgências,
à política guerreira do Papa e à sua infalibilidade. Novamente excomungado,
teve que se afastar de Praga.
A despeito
das garantias de um salvo-conduto para comparecer ao Concílio de Constança
(1414), foi encarcerado por vários meses numa prisão infecta, sendo condenado e
queimado vivo nessa cidade, onde enfrentou a morte com grande coragem, tendo
sido humilhado antes com o despojamento das vestes sacerdotais, tão logo lhe
puseram na cabeça uma coroa ridícula de papel, onde escreveram a injuriosa
alcunha de “heresiarca”.
Huss
ainda vivia quando os seus livros foram queimados, perpetrando-se um triste
auto-de-fé de suas obras (em 9/10/1861 fizeram o mesmo com os livros de Kardec,
no Auto-de-fé de Barcelona, mas não conseguiram queimá-lo vivo!), as quais
foram publicadas, postumamente, primeiro em Nuremberg, em 1558, e séculos
depois em Praga (1903-1908, Obras completas do mestre Jan Huss), em oito
volumes.
Naqueles
tempos de grande intolerância, Jan Huss foi considerado o 1º mártir da
liberdade religiosa, dezesseis anos antes que a heroína francesa Joana d’Arc
(1412-1431) fosse queimada viva por essa mesma intolerância religiosa, e mais
de cem anos antes que outro célebre reformador, o teólogo alemão Martinho
Lutero (1483-1546), apresentasse suas 95 Teses, em 1517.
Os hussitas
Os
seguidores de Jan Huss foram os hussitas, que tentaram impor ao país as
doutrinas do reformador, combinando-as com um sentimento de forte nacionalismo
tcheco, antialemão. Além da morte de Huss, que provocou ressentimentos e
revoltas na Boêmia, mais dois fatores influíram na revolução que convulsionou o
país: a proibição de que o povo tcheco exercesse o culto religioso, segundo
suas próprias crenças e o martírio na fogueira de Jerônimo de Praga
(30/5/1416), fiel discípulo de Huss.
Jan
Huss também é considerado um precursor da Reforma protestante. Os hussitas
aliaram-se aos luteranos no século XVI. A rebelião de 1618 dos hussitas contra
a dinastia dos Habsburgos católicos deu início à Guerra dos Trinta Anos, sendo
a Boêmia recatolicizada depois de sua derrota (1621). Os tchecos, porém,
permaneceram nacionalistas e anticlericais – o que foi decisivo na luta secular
que travaram contra os Habsburgos católicos e na conquista da sua
independência, em 1918.
Jan Huss e Allan Kardec
Segundo
o distinto pesquisador espírita Canuto Abreu, a notícia de Jan Huss ter
reencarnado como Allan Kardec veio em 1857, através da psicografia da médium
Ermance Dufaux.2 Notemos, assim, a modéstia e a humildade de Kardec, que nunca
se referiu em vida a este fato. A preciosa fonte dessa notável informação
estava, em 1921, na Livraria de Leymarie, onde o Dr. Canuto a copiara. Em 1925,
passou para o arquivo da Maison des Spirites, tendo sido destruída pelos
alemães em 1940 durante a invasão de Paris.
Sim,
esta profunda revelação é digna de destaque: o ilustre codificador Allan Kardec
foi a reencarnação do pregador Jan Huss, mártir da fé e reformador da língua do
seu país, como lexicógrafo emérito, sendo igualmente um eminente tradutor ao
idioma tcheco. O paralelo entre as duas personalidades é realmente notável.
Observemos também o período exato de 500 anos entre a data de nascimento de
Huss e a de desencarnação de Kardec.
Como
professor Hippolyte Léon Denizard Rivail, o futuro Allan Kardec, além de
preclaro educador, foi também tradutor de livros para diferentes idiomas, entre
os quais se destaca: Les trois premiers livres de Télémaque en allemand (Paris:
Bobée et Hingray Éditeurs, 1830), como oportunamente escrevemos nas páginas de
Reformador.³
Como
Kardec, foi o grande codificador da Doutrina dos Espíritos, que plasmou, de
forma missionária, os elementos da emancipação e regeneração da humanidade. O
mesmo Espírito, na sua autêntica vivência cristã em ambas as personalidades,
teve grande intimidade com a mensagem de Jesus e o Novo Testamento, sendo o
Espiritismo, desse modo, o Cristianismo Redivivo.
Há
vários séculos, portanto, que esse Espírito de escol, além de se destacar por
alavancar o progresso geral da Terra, vem se doando através do martírio, no
generoso auxílio a todos pela vivência das elevadas propostas filosóficas,
científicas e religiosas, em nome de Jesus, abordando também, em vida, as
questões ortográfico-gramaticais e o importante quesito das traduções, com a
mestria que lhe é peculiar.
A mensagem do Espírito Jan Huss
Lemos,
na Revista Espírita de setembro de 1869, o artigo Precursores do Espiritismo –
Jan Huss, uma comunicação mediúnica desse Espírito elevado, datada de 14 de
agosto de 1869 e ditada em Paris,4 após ter sido evocado por um dos médiuns da
Société Parisienne des Études Spirites.
Os
continuadores de Kardec na direção da Revue Spirite registraram o seguinte,
antes de transcrever a mensagem do Espírito Huss e depois de terem publicado
algumas notícias biográficas dele, por ocasião das comemorações dos 500 anos de
nascimento do grande reformador (1369-1869), notícias seguidas por uma
instrução do Espírito Allan Kardec (três dias depois, em 17/8/1869), de
relevante importância doutrinária:
Evocado
por um de nossos médiuns, o Espírito Jan Huss deu a seguinte comunicação, que
nos apressamos em mostrar aos nossos leitores, bem como uma instrução do Sr.
Allan Kardec sobre o mesmo assunto, porque nos parecem bem caracterizar a
natureza do homem eminente, que se ocupou com tanto ardor, desde o século
quinze, a preparar os elementos da emancipação e da regeneração filosóficos da
humanidade.4
(Paris,
14 de agosto de 1869)
A
opinião dos homens pode dispersar-se momentaneamente, mas a justiça de
Deus, eterna e imutável, sabe recompensar, quando a justiça humana castiga
perdida pela iniquidade e pelo interesse pessoal. Apenas cinco séculos – um
segundo na eternidade – se passaram desde o nascimento do obscuro e modesto
trabalhador e já a glória humana, à qual ele não se prende mais, substituiu a
sentença infamante e a morte ignominiosa, incapazes de abalar a firmeza de suas
convicções.4
Como és
grande, meu Deus, e como é infinita a tua sabedoria! Sob o teu sopro poderoso
minha morte tornou-se um instrumento de progresso. A mão que me feriu alcançou,
com o mesmo golpe, os terríveis erros seculares de que se encharcou o espírito
humano. Minha voz encontrou eco nos corações indignados pela injustiça de meus
algozes, e meu sangue, derramado como um orvalho benfazejo sobre um solo
generoso, fecundou e desenvolveu nos espíritos adiantados de meu tempo os
princípios da eterna verdade. Eles compreenderam, refletiram, analisaram,
trabalharam e, sobre bases informes, rudimentares das primeiras crenças
liberais, edificaram, na sucessão das eras, doutrinas filosóficas
verdadeiramente generosas, profundamente religiosas e eternamente progressivas.
[…]4 (Grifos nossos.)
E, mais
adiante, o mesmo Espírito Huss continua sua profunda mensagem, fazendo um
paralelo entre suas antigas crenças – que defendeu com heroísmo até sua morte
na fogueira –, com as verdades novas, descobertas como Espírito imortal:
Aos que
me pediam uma retratação, respondi que só renunciaria às minhas crenças diante
de uma doutrina mais completa, mais satisfatória, mais verdadeira. Pois bem!
desde esse tempo meu Espírito se engrandeceu; encontrei algo melhor do que
havia conquistado e, fiel aos meus princípios, repeli sucessivamente o que
minhas antigas convicções tinham de errôneo, para acolher as verdades novas,
mais largas, mais consentâneas com a ideia que eu fazia da natureza e dos
atributos de Deus. Espírito, progredi no espaço; voltando à Terra, progredi
também. Hoje, voltando novamente à pátria das almas, estou na fila da frente ao
lado de todos os que, sob este ou aquele nome, marcham sincera e ativamente
para a verdade e se dedicam, de coração e de espírito, ao desenvolvimento
progressivo do espírito humano.4
Obrigado
a todos os que reverenciam em minha personalidade terrestre a memória de um
defensor da verdade; obrigado, sobretudo, aos que sabem que, acima do homem há
o Espírito, libertado pela morte dos entraves materiais, a inteligência livre
que trabalha de acordo com as inteligências exiladas, a alma que gravita
incessantemente para o centro de atração de todas as criações: o infinito,
Deus! Jan Huss 4 (Grifos nossos.)
A mensagem do Espírito Allan Kardec
Logo
após a comunicação do Espírito Jan Huss, os continuadores do codificador
transcreveram a mensagem do Espírito Allan Kardec,5 da qual registramos somente
alguns trechos, deixando aos leitores o cuidado de a estudarem de modo mais
aprofundado, ao compulsarem diretamente as páginas históricas da Revista
Espírita:
(Paris,
17 de agosto de 1869)
[…] – A
tribo, ou se quiserdes, a nação, o universo avançam em idade e as balizas se
multiplicam, semeando aqui e ali os princípios de verdade e de justiça que
serão a partilha das gerações que chegam. Essas balizas esparsas são os
precursores; eles semeiam uma ideia, desenvolvem-na durante sua vida terrena,
vigiam-na e a protegem no estado de Espírito, e voltam periodicamente através
dos séculos para trazerem seu concurso e sua atividade ao seu desenvolvimento.
Tal foi
Jan Huss e tantos outros precursores da filosofia espírita. […]
Jan
Huss encontrou no Espiritismo uma crença mais completa, mais satisfatória que
suas doutrinas e o aceitou sem restrição. – Como ele, eu disse aos meus adversários
e contraditores: “Fazei algo melhor e me reunirei a vós.”5
O
progresso é a eterna lei dos mundos, mas jamais seremos ultrapassados por ele,
porque, do mesmo modo que Jan Huss, sempre aceitaremos como nossos os
princípios novos, lógicos e verdadeiros que cabe ao futuro nos revelar. Allan
Kardec (Grifos nossos.)5
Precursor da filosofia espírita
O
respeito de Kardec por Huss já era grande (chegou a chamá-lo “um dos
precursores da filosofia espírita”), apesar de essa admiração ser silenciosa e
discreta, desde a sua encarnação como codificador, conforme podemos constatar
nas páginas da Revista Espírita de dezembro de 1868, item V, intitulado
Comissão Central,6 ao ser abordada a Constituição transitória do Espiritismo,
quando o mestre de Lyon registrou para a posteridade:
Às
atribuições gerais da comissão serão anexados, como dependências locais:
1º –
Uma biblioteca, onde se encontrem reunidas todas as obras que interessem ao
Espiritismo e que possam ser consultadas no local, ou cedidas para leitura
fora;
2º – Um
museu, onde se achem colecionadas as primeiras obras de arte espírita, os
trabalhos mediúnicos mais notáveis, os retratos dos adeptos a quem a causa
muito deva pelo devotamento que tenham demonstrado, os dos homens a quem o
Espiritismo renda homenagem, embora estranhos à Doutrina, como benfeitores da
humanidade, grandes gênios missionários do progresso etc. […] 6 (Grifos dos
originais.)
Neste
ponto Kardec coloca a seguinte Nota de sua autoria, que visa esclarecer os
belos objetos de arte que já faziam parte do futuro museu do Espiritismo:
O
futuro museu já possui oito quadros de grande dimensão, que só esperam um local
conveniente; verdadeiras obras-primas, especialmente executadas em vista do
Espiritismo, por um artista de renome, que generosamente os doou à Doutrina. É
a inauguração da arte espírita, por um homem que alia à fé sincera o talento
dos grandes mestres. Em tempo hábil faremos a sua descrição detalhada. (Grifos
nossos.)
Após a
desencarnação de Allan Kardec, os seus continuadores na Revue Spirite revelaram
finalmente o nome desses quadros,7 bem como o do artista de renome (o Sr.
Monvoisin) que os executou:
Estes
oito quadros compreendem: o retrato alegórico do Sr. Allan Kardec; o Retrato do
autor; três cenas espíritas da vida de Joana d’Arc, assim designadas: Joana na
fonte, Joana ferida e Joana sobre a sua fogueira; o Auto-de-fé de Jan Huss; um
quadro simbólico das Três Revelações e a Aparição de Jesus entre os apóstolos,
após sua morte corporal. […] (Destaque nosso.)
Jesus, João Huss e Allan Kardec
Em
belíssima mensagem que se encontra em Reformador de setembro de 1978,8 o
Espírito Humberto de Campos, através do mediunato de Chico Xavier, registra o
momento sublime em que Jesus se dirige a Jan Huss, antes de reencarnar como
Allan Kardec, numa assembleia de Espíritos elevados, no plano espiritual,
planejando o século XIX sob as diretrizes do Cristo:
Depois
de se dirigir aos numerosos missionários da Ciência e da Filosofia, destinados
à renovação do pensamento do mundo no século XIX, o Mestre aproximou-se do
abnegado Jan Huss e falou, generosamente:
Não
serás portador de invenções novas, não te deterás no problema de comodidade
material à civilização, nem receberás a mordomia do dinheiro ou da autoridade
temporal, mas deponho-te nas mãos a tarefa sublime de levantar corações e
consciências.
A
assembleia de orientadores das atividades terrestres estava comovida. E ao
passo que o antigo campeão da verdade e do bem se sentia alarmado de santas
emoções, Jesus continuava: […]
É
indispensável estabelecer providências que amparem a fé, preservando os
tesouros religiosos da criatura. Confio-te a sublime tarefa de reacender as
lâmpadas da esperança no coração da humanidade.
O
Evangelho do Amor permanece eclipsado no jogo de ambições desmedidas dos homens
viciosos!… Vai, meu amigo. Abrirás novos caminhos à sagrada aspiração das
almas, descerrando a pesada cortina de sombras que vem absorvendo a mente
humana. Na restauração da verdade, no entanto, não esperes os louros do mundo,
nem a compreensão dos teus contemporâneos. […]
Ante a
emoção dos trabalhadores do progresso cultural do orbe terreno, o abnegado Jan
Huss recebeu a elevada missão que lhe era conferida, revelando a nobreza do
servo fiel, entre júbilos de reconhecimento.
Daí a
algum tempo, no albor do século XIX, nascia Allan Kardec em Lyon, por trazer a
divina mensagem.
Espírito
devotado, jamais olvidou o compromisso sublime. […]
[…] Ao
fim da laboriosa tarefa, o trabalhador fiel triunfara.
Em
breve, a doutrina consoladora dos Espíritos iluminava corações e consciências,
nos mais diversos pontos do globo. […] Allan Kardec não somente pregou a
doutrina consoladora; viveu-a. Não foi um simples codificador de princípios,
mas um fiel servidor de Jesus e dos homens. (Grifos nossos em todos os
parágrafos.)
Homenagem e conclusão
Honra,
pois, a esse Espírito de escol, seja na roupagem de Allan Kardec ou na de Jan
Huss (o vocábulo Huss significa, em tcheco, pato ou ganso). Acerca deste último
vulto lembramos com gratidão os 600 anos do seu martírio, em prol da Verdade,
homenageando-o e recordando as palavras emocionadas do mártir ao ser queimado
vivo na fogueira de Constança, o qual reencarnará como Allan Kardec, o célebre
codificador da Doutrina Espírita: “Hoje assais um pato, mas dia virá em que o
cisne de luz voará tão alto que vossas labaredas não mais o alcançarão”.
Depois
de dizer essas proféticas palavras, as chamas ardem e lhe cobrem o corpo. O
valente pregador tcheco implora perdão pelo ato infame dos seus inimigos e
continua orando a Deus, entregando-se a Ele de corpo e alma. Queimaram o seu
corpo, mas não as suas ideias, pelas quais lutava o bom combate para reformar
profundamente os maus costumes e os abusos eclesiásticos; também não
conseguiram queimar o Ideal Superior que o guiou na procura e defesa da
Verdade.
O local
da sua morte é marcado até hoje com uma pedra memorial; suas cinzas foram
atiradas nas águas do rio Reno, e na praça central de Praga erigiram, em sua
homenagem, uma imponente estátua, monumento impressionante que faz jus à sua
Vida e Obra, a fim de perpetuar-lhe o legado e a memória através dos tempos.
Ninguém mais se lembra dos seus algozes… Jan Huss vive e viverá para sempre no
sentimento coletivo da humanidade, como verdadeiro símbolo do início de uma
Nova Era.
REFERÊNCIAS:
1
ENCICLOPÉDIA Mirador Internacional. Encyclopædia Britannica do Brasil. São
Paulo e Rio de Janeiro, 1989. 20 volumes. 11.565 p., ilus. Editor: Antonio
Houaiss. HUS (Jan), v. XI, p. 5.915.
2
IMBASSAHY, Carlos. A missão de Allan Kardec. 2. ed. Curitiba, PR: FEP, 1988.
pt. I, cap. João Huss, p. 43.
3
BALDOVINO, Enrique Eliseo. O professor Rivail também foi tradutor. Reformador,
ano 125, n. 2.139, p. 39(245)- 40(246), jun. 2007.
4
KARDEC, Allan. Revista espírita: jornal de estudos psicológicos. ano 12, n. 9,
p. 372-374, set. 1869. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 3. ed. Rio de Janeiro:
FEB, 2009. Precursores do Espiritismo – Jan Huss.
5 ____.
____. Mensagem do Espírito Allan Kardec, p. 374-375.
6 ____.
____. ano 11, n. 12, p. 525-526, dez. 1868. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 2.
ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Constituição Transitória do Espiritismo, it. 5;
Nota de Allan Kardec, n. 56.
7 ____.
____. ano 12, n. 6, p. 250, jun. 1869. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 3. ed. Rio
de Janeiro: FEB, 2009. Museu do Espiritismo.
8
XAVIER, Francisco C. Lembrando Allan Kardec. Pelo Espírito Humberto de Campos.
Reformador, ano 96, n. 1.794, p. 25(293)-26(294), set. 1978.
Assinar:
Postagens (Atom)